terça-feira, 11 de agosto de 2009

XIXI NA CAMA (Valéria Nogueira Eik)

Carolina tem quatro anos. É um doce de criaturinha!
Os olhos são amendoados e castanhos. Os cabelos, lisos e fartos, emolduram a sua carinha levada. E a pele tem um tom moreno distribuído por igual.
Corre e brinca o dia todo.
Mas quando a noite chega, traz consigo, além da lua e das estrelas, um pequeno problema: o xixi na cama, que molha desde o pijaminha até o colchão.
Carolina morre de vergonha.
Gostaria, ela mesma, de trocar os lençóis, e no dia seguinte, antes que todos se levantassem, lavar a roupa de cama e o pijama.
Mas é apenas uma menininha. E tem medo. Ah, o medo! Mostra bicho papão, saci e curupira. Mostra tudo o que não existe. E a noite fica cheia de monstros umedecidos pelo xixi da Carolina.
Às vezes, dorme na cama molhada mesmo. E quando vence a vergonha e o medo chama a mãe.
Lá vem Dona Margarida, cheia de sono e paciência, fingindo nem ter percebido a cachoeira amarelinha que quase inunda o quarto.
Leva Carolina ao banheiro para um derradeiro xixi e um banho morno e rápido, e em seguida, troca o pijaminha e toda a roupa de cama.
No dia seguinte, Carolina sente dificuldade para encarar a mamãe.
Dona Margarida anda pensativa, pois quer encontrar um jeito de ajudar a filha. E tem uma idéia.
Compra cartolina e recorta estrelas. Algumas são douradas e outras são prateadas.
Chama Carolina e lhe mostra as estrelas. A menina fica encantada. Até parece nunca ter visto coisa tão linda!
- Mamãe, posso ficar com elas?
- Minha filha, essas estrelas são muito especiais.
- Por que?
- Olhe bem para elas! Veja como são bonitas!
- São “maravilindas”, mamãe!
- Para cada noite que você não fizer xixi na cama, uma dessas estrelas prateadas será sua. E após uma semana de noites sequinhas, você receberá uma estrela dourada. Quer tentar?
- Vou conseguir todas as estrelas, mamãe. Você me ajuda?
- Claro, querida.
Carolina estava preocupada quando a noite retornou.
Queria porque queria ganhar todas as estrelas.
Será que conseguiria amanhecer sequinha, sem fazer xixi na cama?
Pois muito bem. Na hora de dormir, fez um xixi enorme no banheiro. E em suas orações, pediu ao Papai do Céu que fechasse a sua torneirinha durante a noite toda.
Dormiu. Mas acordou sobressaltada algumas vezes. Passava a mãozinha na cama e suspirava aliviada.
- Ufa! Até aqui, tudo certo.
Quando o dia entrou pelas frestas da janela, Carolina gritou de alegria. Não tinha feito nenhum pingo de xixi na cama.
- Manhê! Manhê! Cadê a minha estrela? Cadê?
Dona Margarida abraçou a filha e disse:
- Parabéns, meu amor, você conseguiu! Aqui está a sua primeira estrela prateada.
Depois de uma semana, Carolina recebeu a sua primeira estrela dourada. E de estrela em estrela, ela venceu a dificuldade.
A partir das estrelas, ela compreendeu que a vitória é construída passo a passo, com muita vontade e determinação.



Valéria Nogueira Eik


Fotografias, histórias infantis, crônicas, poemas e contos publicados em vários sites literários.


Editora da revista de literatura e arte Conexão Maringá http://www.conexaomaringa.com


E-mail: contato@conexaomaringa.com


VÔO DE PAPEL (Francisco Simões)


Solta a tua alegria
Feliz e vadia no ar,
Faz flutuar no espaço,
Rompendo o mormaço
Com teu braço gigante
De linha ou barbante
Tua asa, teu céu,
Teu vôo de papel.

Rege com as mãos o bailado
Aéreo dançado,
Teus sonhos cruzando
Com sonhos rivais,
Buscando tais quais
A mesma vitória
E ter uma estória
Para depois contar.

Guarda na tua alegria
Feliz e vadia, menino,
Teus sonhos bem pequeninos
Para poderes crescer e sonhar.
Nas tantas batalhas perdidas,
Nas muitas linhas partidas
Foge sempre um pouco da gente.
Estes sonhos não vão voltar.

(Dezembro/1999)

(Este poema ganhou o primeiro lugar no Concurso Literário dos sites “Sociedade dos poetas” e “Mural Livre”.)


Francisco Simões

Escritor, poeta, fotógrafo (expositor), ex-radialista.
Rio de Janeiro
E-mail: fm.simoes@terra.com.br
http://www.franciscosimoes.com.br
http://www.riototal.com.br/expressao-poetica/francisco_simoes.htm

Carolina Trovão, seu colar de corais e o raiozinho de sol (Vicência Jaguaribe)

(Uma história para a Carolina Trovão).


Colar de Carolina

Com seu colar de coral,Carolina corre por entre as colunasda colina.

O colar de Carolinacolore o colo de cal,torna corada a menina.

E o sol, vendo aquela cordo colar de Carolina, põe coroas de coral

nas colunas da colina.

(Cecília Meireles)


- Carolina, corra aqui, me ajude com esta bacia!
E a Carolina acionava as asinhas de seus pés, feito Hermes, o mensageiro dos deuses, e voava para ajudar a mamãe. A bacia estava cheia de roupa lavada para estender no quintal.
- Carolina, onde estão os meus óculos? Preciso ler o jornal e não os encontro!
E a Carolina abria bem seus olhos de lince e achava os óculos do vovô, que fazia um ar de felicidade ao abrir o jornal.
- Carolina! Carolina! Me ajude a pentear os cabelos, que já estou atrasada para a missa!
E a Carolina, com suas mãozinhas de fada, fazia um coque no cabelo da vovó e o prendia com um pente de madrepérola. E a vovó ia bonita e feliz rezar pela família.
- Carolina, leve a Silvinha para passear na colina!
E a Carolina punha seu colar de coral e levava a irmãzinha para passear na colina. E a Carolina ficava mais bonita com os corais do colar colorindo seu colo de cal.
A Carolina, segurando na mão da irmãzinha, apostava corrida com a própria sombra, que às vezes se escondia nas colunas da colina.
A Carolina Trovão era assim: em casa era pau para toda obra. Os adultos nunca a deixavam em paz, e a Carolina ajudava todo mundo. E era um tal de gritar, chamando a Carolina – Carolina, isso; Carolina, aquilo; Carolina, aquilo outro!
E a Carolina Trovão não era Trovão só no sobrenome, não! A Carolina parecia ser o resultado de uma descarga elétrica, que a fazia correr em vez de andar; que lhe conservava em alerta todos os sentidos – seus olhos viam mais; seus ouvidos ouviam mais; seu nariz cheirava mais; sua boca sentia mais gosto e suas mãos tinham mais sensibilidade do que... os olhos, os ouvidos, o nariz, a boca e as mãos das outras crianças e também dos adultos.
Mas a Carolina Trovão era, principalmente ruidosa – falava alto, ria alto, cantava alto e não deixava que ninguém ficasse triste ou desconsolado perto dela. E, sempre que podia, gostava de brincar com gente, com bicho, com coisas e, principalmente, com os elementos da natureza.
Naquele dia, na colina, com a Silvinha, ela percebeu que um raiozinho de sol insistia em tocar nos corais de seu colar. Ela, então, resolveu brincar de esconde-esconde de corais com ele.
Primeiro, puxou seus longos e lisos cabelos ruivos para a frente e escondeu os corais do colar. Mas o vento, amigo do raiozinho de sol, mandou uma rajada, que levantou a bela cabeleira da Carolina, deixando à mostra os corais do seu colar. E o raiozinho de sol caiu diretamente sobre eles.
Depois, ela levantou a gola da blusa de modo a fazer a fazenda cobrir os belos corais do colar. Um raio de sol mais forte do que o raiozinho brincador virou-se diretamente para a Carolina. Ela sentiu tanto calor, que o jeito foi abrir os primeiros botões da blusa e deixar à mostra os lindos corais de seu colar. E o raiozinho de sol refletiu diretamente sobre eles.
Por último, ela tentou proteger-se pelas sombras das colunas da colina, mas o sol mudou de posição, e as sombras foram para o outro lado da colina. Ela ficou, assim, cara a cara com o raiozinho de sol, que se lançou todinho sobre os corais de seu belo colar. E as duas meninas – a Carolina e a Silvinha – viram um espetáculo lindo, que elas nunca tinham visto nem no cinema: os reflexos dos corais do colar da Carolina enfeitaram de coroas de coral as colunas da colina.



Vicência Maria Freitas Jaguaribe

Natural de Jaguaruana-Ce
Professora de Literatura e Estilística da Universidade Estadual do Ceará.
Mestra em Literatura pela UFC.
Trabalhos publicados nas áreas de Literatura, Estilística e Lingüística do Texto.

E-mail: vmjaguaribe@netbandalarga.com.br

Bicho-de-goiaba (Odete Ronchi Baltazar)


Fui comer uma goiba,


- que delícia!


madurinha...


Mas com essa eu não contava,


- oh que pena!


é que tivesse,


lá no meio,


uma feia minhoquinha.


ARG! eu não como essa coisa - tão feiosa e pequeninha.


Já pensou?


- esse bicho esquisito vai parar


lá na minha barriguinha?



Odete Ronchi Baltazar, ou odeteronchibaltazar como é conhecida na internet, nasceu em Rio Maina, Município de Criciúma, Estado de Santa Catarina em 1953. Atualmente reside em Florianópolis.É formada em Língua Portuguesa, com especialização em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de Santa Catarina.Publica seus trabalhos em sites, blogs, e-books e Antologias que saíram do virtual e foram para o mundo real.- Publicou o livro solo "Só Poesia" em maio de 2006, pela Editora da AVBL. Tem participações em Antologias, tais como:- DiVersos, Ed Scortecci, 2002- Com licença da Palavra, Ed. Scortecci, 2003 - 1ª Antologia Poética AVBL, Ed da AVBL, 2004 - Virtualismo, Ed AVBL, 2005- uniVERSOS, gráfica e Ed Ivan, 2005- 2ª Antologia Poética- Literária AVBL, Ed da AVBL, 2006- 3ª Antologia Poética- Literária AVBL, Ed da AVBL, 2008- 4ª Antologia Poética- Literária AVBL, Ed da AVBL, 2008.


Seus sites pessoais:


MELECA (Lilian Maial)


Ela rola e ela dança,
Dá cambalhota risonha,
Pára num canto e descansa,
E nos faz passar vergonha.
Quando se mostra pro mundo,
Vem gargalhada no fundo,
Dessa cara de pamonha.

A vida tem desses lances:
Hora de rir e chorar.
Tem hora até pros romances,
Tem hora até pra estudar!
Mais chata é a hora do banho,
Se eu não tomar, eu apanho,
Depois, quem quer acabar?

Começa a lavar criança!
Lava o pé e a sobrancelha,
Lava o sovaco e a pança,
Lava bumbum e a orelha.
Não esquece da careca,
Lava o sapo e a perereca,
Assim mamãe aconselha.

Quando eu acabo e me seco,
Vou pingando pro meu quarto,
Mamãe quase tem um treco,
Dia desses tem um infarto,
Leva todo a roupa suja,
Me penteia de lambuja,
Seu beijinho eu não descarto.

E assim, limpo e cheiroso,
Parecendo uma boneca,
Vou pra rua até o almoço,
Brincar levado da breca.
Até virar gozação,
Da turma do quarteirão,
Por causa dessa meleca!

Volto sujo e fedorento,
Algo triste e aporrinhado,
Suado, nariz escorrendo,
Dos amigos, afastado.
Olham pra mim, dizem: - Eca!
Mas da gostosa meleca,
Não vou ficar separado!



Lilian Maial

E-mail: lilian.maial@gmail.com

Carioca, médica, escritora e poeta. Publicou um livro de poemas em 2000 – “Enfim, renasci!”, e tem participação em dezenas de antologias desde 1999. Autora premiada de diversos concursos de poemas, de contos e crônicas dentro e fora da internet, além de articulista de algumas revistas eletrônicas e listas de discussão. Integrante ativa do MIP (Movimento Internacional Poetrix), da qual é Coordenadora Regional no Rio de Janeiro, teve seus poetrix publicados, em 2002, na “Antologia Poetrix”, e em 2007, na “Antologia Poetrix II”, além de ter organizado um e-book com poetrix de 10
10 participantes do MIP. Filiada à REBRA (Rede de Escritoras Brasileiras), já participou de 4 antologias lançadas pela REBRA, através da Editora Scortecci, de 2002 a 2006, com lançamentos nas Bienais do Livro de São Paulo. Filiada à APPERJ (Associação de Poetas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro). Consulesa do Rio de Janeiro para o movimento Poetas Del Mundo. Tem seus trabalhos divulgados em inúmeros sítios nacionais e internacionais, é colaboradora de revistas eletrônicas em vários Estados do Brasil (“Click Negócios”, “Jornal ECOS” – de Vânia Moreira Diniz, “Portal Blocos” – de Leila Miccolis, “Momento Lítero Cultural” - de Selmo Vasconcellos, “Portal Maytê” – de Maria Tereza Albani, “SOBRAMES” - Sociedade de Médicos Escritores, “Jornal Varginha On Line”), assim como em Portugal (“Cá Estamos Nós”), e em língua espanhola (“Islas Negras”).

Por causa de uns 5 anos (Miriam Carrilho)



(Para a minha neta Gabriela)



Gabriella, Bibi, bela,

na janela, nela, ela,

não me viu.



Viu, viu? Vai brincar, sua sapeca,

vai brincar, minha boneca,

vai nadar lá na piscina.



Vai, menina,

vai correr a mais de mil.

Mas por favor, venha me ver,

me abraçar e me beijar:

amo você.



Um dois, três, quatro,

quero, quero o seu retrato

eu quero mais, e sempre mais,

quero você.



Com seu riso,

seu olhar,

seu bem-querer,

seu dizer de improviso

o que vem do coração

que por sorte, não tem freio

(ainda bem) nem aperreio:

já lhe basta a emoção.



Mas agora eu não brinco - acredita?

Vou cantar a nova idade

da criança mais bonita

que completa hoje cinco

doces anos de amor, felicidade.



Seu viver todo inteirinho

com saúde e alegria,

muita luz em seu caminho

muita paz e harmonia.



Isso é tudo o que desejo

e lhe entrego com um beijo.



Miriam Monte Carrilho de Oliveira




Nasci em Natal / RN, no mês de maio de 1947. Pelo menos é isso o que está registrado na minha identidade. Estudei interna, como era costume na época. Mal saí, casei, Muito nova, dois filhos, descasei. Airosa, arranjei outro, ousei, floresci mais duas. Por hoje, cinco netos, meus xodós. E quero mais. Cursei Administração na UFRN porque apareceu um belo estágio no Banco do Nordeste. Jornalismo na UNICAP movida pelo insano e inocente desejo da verdade acima de qualquer suspeita. Minha incursão no ramo se deu por uma entrevista a um escritor famoso, não aceita por nenhum jornal daqui. A Tribuna da Imprensa de Hélio Fernandes, lá no Rio, publicou-a na íntegra. Folhas Esparsas, com poemas de épocas e temas diversos, um sonho que se fez. Desenhar e pintar, outras manias acalentadas. Meu trabalho é ser livreira, embora como funcionária pública e privada tenha gasto um bocado do meu juízo. Leio, sim, sempre, embora o tempo não dê pra “devorar” tudo o que quero. Sou geminiana inquieta, insatisfeita com o mundo que me cerca, sempre a desejar mais e mais, com uma vontade tola, safada, insistente, de ver o mundo e seus habitantes mais felizes. Pretensão? Talvez. Mas um poeta pernambucano falou que “uma cidade se faz com o sonho dos homens”.
Por que não fazer um mundo com o sonho das mulheres?

domingo, 19 de julho de 2009

O elefantinho que queria voar! (Marlene Cerviglieri)

Eram todos muito unidos, numa família muito grande mesmo.
As brincadeiras dos macacos eram constantes e divertidas.
As cachorrinhas, então, uma gracinha, todas branquinhas e algumas com a cabeça cor de rosa!Havia a família das cobras que não se misturavam muito, estavam sempre dormindo e pareciam famintas o tempo todo.
O Urso marrom já estava muito velhinho e quase não saía de seu cantinho, apesar de ainda participar das funções do circo.
Havia também os Elefantes que apesar de serem muito grandes, eram meigos e brincalhões.
Estavam sempre alcançando as coisas com suas trombas compridas.
Esta família tinha um filhinho, um Elefantinho cinza muito engraçadinho.
Já estava em treinamento para participar das funções do circo.
Toda vez que o traziam de volta para seus pais, ele reclamava.
-Não quero ficar dando voltinhas no picadeiro
- E o que você quer fazer? Perguntou seu pai que todo dia ouvia a reclamação do filho.
- Eu quero aprender a voar, papai, igual ao trapezista!
Nem preciso dizer que o papai Elefante quase caiu sentado ao ouvir isto.
- Como você quer aprender a voar meu filho?
- Ora, aprendendo com o treinador.
- Filho, venha até aqui bem perto de mim e me ouça: Não quero que você se aborreça com o que vou lhe dizer. Preste atenção: veja o meu tamanho.
- Sim, papai, e daí?
- Você vai ficar do meu tamanho e levar as bailarinas em suas costas. Vai ser muito forte e bonito. Com todo o peso que terá será muito difícil pular de um trapézio para outro!
- Você quer dizer que serei gordo e não poderei voar?
- Não te chamei de gordo, mas nós, os elefantes, somos grandes e fortes. Você já imaginou se o Macaco for carregar as bailarinas nas costas?
O Elefantinho riu...
- Seria bem gozado e ele ficaria todo desmontado, coitadinho.
- Então, meu filho, o que te quero dizer é que nem sempre podemos sonhar muito alto, acabamos num tombo. Porém se deve sonhar dentro daquilo que poderemos ter condições de fazê-lo. Cada um aqui tem sua família, e são adestrados dentro do que eles podem fazer. Não fique triste! Um dia entenderá o que estou dizendo.
O Elefantinho ficou todo amuado num canto pensando no que havia ouvido.
Teimoso que era, sem que ninguém percebesse, entrou no picadeiro.
Àquela hora não havia ninguém.
- Se não vou poder voar quando for grande, farei agora que sou mais leve e menor.
Lá foi ele tentar subir a escada para chegar ao topo do trapézio para voar.
É claro que não conseguiu subir na escada, mas derrubá-la.
Todos correram para ajudar o Elefantinho que estava embaixo da escada.
O pai Elefante chegou e com sua força e tromba tirou-o de lá.
- Como você esta meu filho? Machucou-se muito?
- Mais ou menos papai. Acho que quebrei uma de minhas pernas.
Veio o amestrador e medicou o Elefantinho, e ainda pediu desculpas por ter deixado a escada no caminho.
- Nunca esqueço de guardá-la, mas hoje me distraí, falava ele para o dono do circo que estava muito bravo.
Já medicado e em seu cantinho, o Elefantinho pensava:
- Que tolo fui apesar da lição de meu pai. Se eu o tivesse escutado não estaria com essa perna toda enfaixada.E a dor que senti quando a escada caiu!
Às vezes queremos fazer alguma coisa diferente só porque vimos outros fazerem.
Podemos até fazer algo diferente, desde que existam possibilidades para isso.
Ouvir o conselho dos pais ou avós e até mesmo de amigos é interessante.
Assim adormeceu.
No outro dia seus amigos o visitaram.
O dono do circo também. Deu-lhe uns tapinhas nas costas e disse:
- Meu caro Elefantinho, tenha mais cuidado, pois conto com você para novas apresentações. Só você poderá fazê-lo com seu tamanho e força. Portanto, se cuide, meu caro.
O Elefantinho ficou tão alegre e percebeu que ser grande e gordo por natureza também serve para alguma coisa!
- Que voar que nada, vou ficar com minhas patas bem aqui na terra.

É, meu amiguinho! Aprenda com o Elefantinho. Não queira ser diferente. Seja você mesmo e sonhe bastante, mas com muito cuidado!


Marlene Cerviglieri
Nascida em Santo André, São Paulo, Brasil.
Pedagoga, Psicóloga, Escritora de contos, poesias e livros infanto-juvenis.
Dedica-se até hoje a estudar as crianças e suas emoções.
Tem proferido palestras com temas atuais, acompanhadas, de dinâmica de grupo e relaxamento. Na cidade de Santo André atuou como Conselheira de Cultura da Prefeitura e Presidente do grupo de escritores GESA.
Seus trabalhos são divulgados em diversos sites.
E-mail: mcerviglieri@yahoo.com.br

sábado, 18 de julho de 2009

MANIAS DA MARIANA (Valéria Nogueira Eik)

Mariana trançava tudo.
Trançava os cabelos, os braços e os passos.
Sonhava poder trançar os cílios, mas assim seria um exagero.
Fazia tranças nos rabos dos cavalos.
Trançava até o mato quando andava pela fazenda.
A mãe ralhava, mas Mariana dava de ombros e revirava os olhos.
O mundo era mais bonito quando estava trançado.
- Mariana! Vem almoçar!
E lá vinha ela, trançando os passos, pulando espaços, estragando os sapatos.
Sentada à mesa, que surpresa! Macarrão!
Pegava três fios de massa, trançava e comia.
- Mariana! Come direito, minha filha!
Ela disfarçava e juntava mais três fios de massa.
- Mariana, pelo amor de Deus!
- Eu estou comendo direitinho, mamãe.
- Joaquim! Me ajuda aqui com essa menina!
- Ah, Maria! Deixa a Mariana trançar o macarrão.
Com a aprovação do pai as tranças ficaram cada vez mais numerosas.
Ao invés de fazer uma trança nos cabelos das bonecas, ela fazia duas, três, quatro e até dez.
Os cavalos ficavam impacientes e bufavam diante dos penteados cheios de tranças e laços em seus rabos.
E os empregados da fazenda andavam reclamando:
- Seu Joaquim! Assim não dá! A gente chega na cidade e a molecada vem correndo e caçoando.
Mas seu Joaquim apenas ria da mania da filha e dava de ombros.
Uma vez Mariana viu três minhoquinhas e as pobres criaturas viraram trança. E alguns dias se passaram até que elas conseguissem se soltar.
De outra vez, ela juntou três nuvens que estavam pouco acima do morro, trançou tudo, e pouco tempo depois despencou uma tremenda tempestade.
Num belo dia, e nem se sabe se era belo ou não, ela trançou as idéias, e de uma hora para outra deixou de gostar das tranças.
- Milagre, minha Virgem Maria! Milagre! Joaquim! A Mariana não gosta mais de tranças. As minhas preces foram ouvidas!
Maria foi dormir feliz.
Joaquim ficou ressabiado.
E o dia amanheceu normal.
- Mariana! Vem tomar o café da manhã!
A mãe escutou um apito agudo, desses que quase chegam a quebrar as vidraças.
Olhou assustada para o marido, sem saber se queria ou não uma resposta.
- Eu não sei de nada, mulher! Nada! Nada!
- Oh, meu Deus! O que será que vem por aí?


Valéria Nogueira Eik

Fotografias, histórias infantis, crônicas, poemas e contos publicados em vários sites literários. Editora da revista de literatura e arte Conexão Maringá
http://www.conexaomaringa.com/
Blog (Mosaico):
http://valeriaeik.blogspot.com/

Areia da grossa, areia da fina (Vicência Jaguaribe)

Esconde-esconde

Me escondo
atrás da porta,
atrás do armário,
no fundo do poço,
dentro do espelho,
na curva do rio,
no meio do vento,
dentro de mim.


(Roseana Murray)


- Areia da grossa, areia da fina, areia me faça ficar pequenina!
Ela fechava os olhos bem fechados, mas bem fechados mesmo, de verdade, e repetia a fórmula mágica três vezes. Abria os olhos e... não acontecia nada. Lá estava ela, do mesmo tamanho de sempre, do mesmo jeito. Era magricela e tinha braços e pernas tão finos, mas tão finos que o Leôncio... Ah! esperem, ainda não falei do Leôncio pra vocês, não foi?
O Leôncio era um doidinho que ia muito à casa dela. Ele dizia umas coisas muito engraçadas, tipo uma resposta que deu para a mãe dela, quando esta lhe perguntou se estava bonita. Sabem qual a resposta que ele deu? Tá bonita, tá! Tá todinha uma lata de doce.
Pois bem, ela tinha umas pernas tão finas, tão fininhas mesmo, que o Leôncio se dirigia a ela dizendo galça ou pernas de galça. Era assim que ele pronunciava garça, o nome daquela... espera um pouco... vou dar esta informação lá no fim da página, assim, só lê quem quiser. Não é melhor?
E os cabelos dela? Eram castanho-claros e volumosos, arrumados em duas grossas tranças. Pensa que ela gostava do jeito dela, isto é, do próprio jeito – dos cabelos, dos olhos, do nariz, da boca, do corpo? Nana, nina, não. Não mesmo. Até das orelhas, que não tinham nada de diferente das orelhas das outras pessoas, ela não gostava.E tinha também uma história de sentir vergonha de tudo. Tinha vergonha de ser mais alta do que as amigas da mesma idade, tinha vergonha de falar, tinha vergonha de comer, tinha vergonha de estar crescendo, tinha vergonha... escutem bem... o que era pior é que tinha vergonha de sentir vergonha.
§ Garça é ó nome daquela ave grande, que anda em bando, nos rios, nos lagos, nos charcos e nas praias marítimas. Alimenta-se de peixes. Ela tem pernas muito compridas e fininhas, e penas muito bonitas e branquinhas. Quando eu era criança e morava no interior, as penas das garças eram usadas... Sabem para quê? Para fazer as asas que complementavam a roupa de anjo usada pelas crianças nas festas da Igreja.
O ritual areia da grossa, areia da fina, ela – já está passando da hora de dizer o nome dela, não? era Cristina – ela, a Cristina, punha em prática sempre que ouvia certas conversas dos adultos da família.
Que conversas eram essas? Eles diziam entre si – mas ela ouvia sempre – que a Cristina estava muito grande, quase uma mocinha, que logo, logo ia ter que usar sutiã. Já, já, arranjaria namorado e... o pior, meu Deus! Ela não queria nem ter escutado... iria estudar na capital.
Aí, não havia conversa, o encantamento areia da grossa, areia da fina teria que funcionar. Ela já não queria crescer – era um Peter Pan recolhido – e agora, que ficara sabendo das horríveis consequências do crescimento, pior!
(Aqui pra nós, e não contem a ninguém, a Cristina era, na realidade, uma menina medrosa – covarde mesmo. Ela tinha o maior medo de enfrentar o desconhecido e o novo. Essas coisas que o crescimento traz e que todo mundo tem de encarar.)
Naquela noite, a Cristina foi dormir mais cedo. Queria acordar de madrugada para pronunciar as palavras mágicas no silêncio e no sossego da escuridão. Levantou-se meio sonolenta, abriu a porta do guarda-roupa, que tinha um grande espelho, e tentou concentrar-se. Mas, diga se ela conseguiu. Que nada! Fez foi se lembrar da Alice. Aquela, de Alice no país das maravilhas, se lembram?
Desde que lera aquele livro, a Cristina passou a achar que, diante de um espelho, tudo poderia acontecer. Antes mesmo de ler esse livro, já achava espelho um objeto especial e confiável – daqueles que só dizem a verdade. É só pensar no espelho da madrasta da Branca de Neve, para ver como é verdade.
Olhou o relógio, que marcava cinco horas. Fechou os olhos bem fechados e disse três vezes a fórmula mágica:



Areia da grossa, areia da fina, areia me faça ficar pequenina!
Areia da grossa, areia da fina, areia me faça ficar pequenina!
Areia da grossa, areia da fina, areia me faça ficar pequenina!



E disse com tanta fé e com tamanha vontade que o encantamento desse certo que o coração acelerou. Mas acelerou tanto que ela ficou meio tonta e teve de segurar-se na porta do guarda-roupa. Conservava ainda os olhos bem fechados.
Quando abriu os olhos, viu-se em uma rua movimentada. E estava minúscula, tão pequena que foi empurrada por uma rajada de vento. E nem era um vento tão forte! Teve que segurar-se no galho de um pé de boa-noite, para não cair em uma boca-de-lobo. Uma aranha, que fabricava sua teia ali por perto, quis saboreá-la. E, se não fosse a agilidade e a prontidão do raciocínio da menina, teria conseguido. Mais adiante, quase foi atropelada pelo pé de um quase bebê de dois anos. Minha Nossa Senhora! Quanto perigo em tão pouco tempo! Raciocinou rapidamente e concluiu que não poderia ficar exposta ao vento, aos insetos e aos pés dos homens. Subiu na calota de um carro parado e ficou bem escondidinha.
Sentiu um vazio no estômago... fome... e agora? Do tamanho em que estava, onde poderia pegar comida? E estava em frente a um café. Saiu do esconderijo e aproximou-se da porta. Mas, com as suas perninhas curtas, e bote curtas nisso, não conseguiu escalar o batente.
Viu, então, perto da porta, uma senhora que olhava para dentro do estabelecimento, antes de entrar. A Cristina, que esperava uma oportunidade, que fez? Agarrou-se na barra da saia comprida da senhora e assim entrou no café e assim saiu. Comeu, sem nenhuma vergonha, as migalhas que as pessoas deixavam cair.
Na rua novamente, agora com cuidado, mas sem medo, procurou um lugar onde pudesse fazer xixi. Começou a perceber que tinha sido uma grande bobagem dizer aquelas palavras mágicas. O que fazer para reverter o processo, para voltar ao tamanho de antes? Pensou... pensou... pensou muito, até sentir a cabeça vazia de pensamentos. Mas encontrou a solução. E disse baixinho, três vezes, de olhos bem fechados, a seguinte fórmula:



Aiera ad assorg, aiera ad anif, aiera em açaf racif anineuqep!
Aiera ad assorg, aiera ad anif, aiera em açaf racif anineuqep!
Aiera ad assorg, aiera ad anif, aiera em açaf racif anineuqep!



Sentiu uma forte dor misturada com ardor. A força que fizera na porta do guarda-roupa, para não cair, machucara-lhe a mão. Estava muito cansada. Antes de deitar-se, olhou as horas. Tinha aula. Meu Deus! Perdera a hora! 10h20min. Não pensou em mais nada e adormeceu.
Acordou com a fala da mãe. Levante depressa, está quase na hora da aula. Que foi que aconteceu com seu relógio? Está marcando 10h20min. Ah! está parado. Vou trocar as pilhas. Levante, já são quinze para as sete.
Cristina não estava entendendo nada. Sonhara? Não, não fora um sonho. Abriu a mão direita, que se conservava fechada, e viu umas folhinhas de boa-noite. Olhou a outra mão, e ela estava vermelha e meio inchada de tanto apertar a porta do guarda-roupa. Olhou o relógio e viu que ele adiantara três horas.
Enquanto se arrumava, foi organizando as ideias. Acho que passei umas horas em um mundo à parte. Como se diz? Numa... dimensão... dimensão paralela. Isso mesmo, dimensão paralela. Já li isso em algum lugar. Eu vivi mesmo, não foi sonho. Será que devo ficar calada? Se falar, vão dizer que estou ficando doida, vão sim. Ela soltou as tranças, passou a escova nos cabelos castanhos e cheios, e prendeu-os num rabo-de-cavalo. Gostou do efeito. Pela primeira vez na vida, não se achou muito magra nem muito desajeitada. O penteado deixara as orelhas à mostra. E elas não eram tão feias.
Apanhou os livros em cima da escrivaninha e foi tomar café. Resolvera – falaria a todo mundo sobre a viagem que fizera. Não se importaria com o que dissessem. Aquela rua onde estivera lhe metera medo, mas ela se safara. Fora tudo mais difícil por causa do seu tamanho. Se estivesse em sua altura normal, ela teria enfrentado bem o desconhecido.
É! – pensou a Cristina – a gente tem de crescer na hora certa. Por dentro e por fora. Já ouvi muito adulto dizer isso. E mais – quem cresce só de um lado fica aleijado, fracassado, prejudicado e muitos outros ados. Crescer por dentro... o que será isso? Acho que é... deixar de ter medo e vergonha? Talvez não deixar de ter totalmente, mas enfrentá-los. Porque há medo e vergonha para toda idade, e em cada idade a gente vence só uma parte. Só aquilo que a gente pode.


Vicência Maria Freitas Jaguaribe


Natural de Jaguaruana-Ce

Professora de Literatura e Estilística da Universidade Estadual do Ceará

Mestra em Literatura pela UFC

Trabalhos publicados nas áreas de Literatura, Estilística e Lingüística do Texto

E-mail: vmjaguaribe@netbandalarga.com.br

O CANTO DO GATO (Odete Ronchi Baltazar)

O meu gato é serelepe.
É dengoso e é moleque.


De manhã, quer leite e mia.
Depois, pede carinho, se arrepia.


À tarde, só dorme, vagabundo e preguiçoso...
O rato?_ que descanse, ocioso!


À noitinha, manhoso me arranha.
Quer comida, quer água, quer manha...


Logo, ronrona no meu colo, faceiro.
Estica o rabo, desliza fagueiro.


Mas, num instante, num repelão,
sai a caçar, trabalhar pro patrão!



Odete Ronchi Baltazar, ou odeteronchibaltazar como é conhecida na internet, nasceu em Rio Maina, Município de Criciúma, Estado de Santa Catarina em 1953.

Atualmente reside em Florianópolis.

É formada em Língua Portuguesa, com especialização em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de Santa Catarina.

Publica seus trabalhos em sites, blogs, e-books e Antologias que saíram do virtual e foram para o mundo real.

Publicou o livro solo "Só Poesia" em maio de 2006, pela Editora da AVBL.

LAGARTIXA (Nilto Maciel)

De cima do muro

mundo inteiro avista.

Inseto voando,

comida na pista.

Cabeça balança,

como se negasse

a própria esperança

de viver assim.


Nilto Maciel nasceu em Baturité, Ceará, em 1945.
Ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará em 70.
É editor da revista Literatura desde 91.
É autor de Itinerário (contos, 1974); Tempos de Mula Preta (contos, 1981); A Guerra da Donzela (novela, 1982);Punhalzinho Cravado de Ódio (contos, 198); Estaca Zero (romance, 1987); Os Guerreiros de Monte-Mor (romance, 1988);O Cabra que Virou Bode (romance, 1991); As Insolentes Patas do Cão (contos, 1991); Os Varões de Palma (romance, 1994);Navegador (poemas, 1996); Babel (contos, 1997); Panorama do Conto Cearense (ensaio, 2006) e A Leste da Morte (contos, 2006).
Tem contos e poemas publicados em esperanto, espanhol, italiano e francês.
O Cabra que Virou Bode foi transposto para a tela (vídeo), pelo cineasta Clébio Ribeiro, em 1993.

POESIA DA CRIANÇA (Ivone Boechat)


Toda criança
é semente de paz ou de guerra,
é preciso adubar com educação
os canteiros do sonho infantil.
Afastada da educação,
cuidado, perigo:
a criança deve
aprender e ensinar
o verdadeiro significado
da palavra amigo,
a separar o joio do trigo,
a lutar e vencer.
As crianças são projetos seus,
jamais se esqueça de estar bem perto,
nenhuma vida dá certo,
quando afastada de Deus.

Ivone Boechat

Natural do Estado do Rio.

Membro da Academia Duquecaxiense de Letras e Artes de Duque de Caxias-RJ.

Consultora em Educação.

E-mail: i.boechat@terra.com.br



quinta-feira, 25 de junho de 2009

Fragmento do livro "Psilinha Cosmo de Caramelo" (Nivaldete Ferreira)





Quando a gente acorda
E não sonhou,
parece que o mundo
tinha morrido...

Começa tudo outra vez...

E quando sonha
parece que a fronha
virou uma maquininha
de fazer coisa impossível...

Uma noite eu comi pipoca na cozinha de Deus.
Ele escolheu uma bem bonita,
me deu e disse: -O milho, quando queima,
vira flor...

Falei: -Mas dói...

Deus disse: -Dói quando a gente se queima...
E me mostrou uma pipoca no dedo.
Então soprei o dedo de Deus
e passei um pouquinho de nuvem.
Depois vim pra Terra voando numa música,
Hora staccato (ou será ora, onde está o gato?),
que um tal de Zamfir toca
numa gaita de bambu,
daquelas de índio.
Quando acordei senti cheiro de pipoca
no quarto.
Aí me levantei,
fui pra cozinha e fiz.

Só queimei dois dedos...

(ia esquecendo: e a panela)

E a maioria das pipocas
voou pela janela


Nivaldete Ferreira nasceu em Nova Palmeira-PB e é professora no Departamento de Artes da UFRN.
Doutorado em educação, com a tese "A boneca Emília: por uma pedagogia performática".
Fez estágio doutoral na Universidade Aberta de Lisboa-Portugal.
É autora de "Sertania", 1979, e "Trapézio e outros movimentos", 1994 (poesia).
Teve Menção Especial em concursos da União Brasileira de Escritores (1997), com "Psilinha Cosmo de Caramelo", para criança, e "O descanso das sílabas", conto.
Primeiro Lugar no Concurso Jesiel Figueredo de Textos Teatrais para Criança, com a peça "No reino dos distraídos"; Menção Honrosa no Concurso Câmara Cascudo de Prosa, com o romance "Memórias de Bárbara Cabarrús" (Prefeitura Municipal de Natal), publicado em 2008 pela Fundação Capitania das Artes-Natal-RN.
É autora ainda de: "Entre o carrossel e a lei", teatro, publicado em 2007 pela Editora da UFRN, e de um CD com músicas para crianças, falando do tema "água".
Trabalha atualmente em dois romances e mantém o blog http://lapisvirtual.blogspot.com/, onde escreve pequenas crônicas.
É compositora.

GATO (Nilto Maciel)


Seus olhos verdes

da cor do mato;

seu passo lento

como o de pato;

a garra ao vento

muito afiada;

fome por rato;

sono de fada;

tem sete vidas,

porém não quer

nada com idas

para qualquer

casa de cão

– a perdição.


Nilto Maciel nasceu em Baturité, Ceará, em 1945.
Ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará em 70.
É editor da revista Literatura desde 91.
É autor de Itinerário (contos, 1974); Tempos de Mula Preta (contos, 1981); A Guerra da Donzela (novela, 1982);Punhalzinho Cravado de Ódio (contos, 198); Estaca Zero (romance, 1987); Os Guerreiros de Monte-Mor (romance, 1988);O Cabra que Virou Bode (romance, 1991); As Insolentes Patas do Cão (contos, 1991); Os Varões de Palma (romance, 1994);Navegador (poemas, 1996); Babel (contos, 1997); Panorama do Conto Cearense (ensaio, 2006) e A Leste da Morte (contos, 2006).
Tem contos e poemas publicados em esperanto, espanhol, italiano e francês.
O Cabra que Virou Bode foi transposto para a tela (vídeo), pelo cineasta Clébio Ribeiro, em 1993.
http://niltomaciel.blog.uol.com.br/
http://literaturasemfronteiras.blogspot.com

Os primos e o canto das sereias (Vicência Jaguaribe)

Uma história para o Daniel e a Miriam.

A turminha passava as férias em Tibau. Era primo se encontrando com primo. Primo inteiro e meio-primo. Primo torto e primo direito. Primo de um lado e primo do outro. E primo dos dois lados.
E a casa da prima ficava cheia – cheia de filhos, de sobrinhos e de primos. Aquela casa bem pertinho do mar... tão pertinho... mas tão pertinho mesmo que, quando era maré alta, a água batia no paredão de pedra.
- Ora! Mas você não sabe que o paredão foi construído por isso mesmo? Pra água não avançar!
E era gostoso, mas gostoso demais, porque os primos se sentiam como se estivessem em um navio! E o navio balançava... Para cá, para lá... Para cá, para lá... feito uma música de Debussy, como diz Manuel Bandeira. Querem ver? É assim:


Debussy

Para cá, para lá...
Para cá, para lá...
Um novelozinho de linha...
Para cá, para lá...
Para cá, para lá...
Oscila no ar pela mão de uma criança
(Vem e vai...)
Que delicadamente e quase a adormecer o balança
- Psiu...
Para cá, para lá...
Para cá e...
- O novelozinho caiu.

E tinha o morrinho onde os primos e os meios-primos e todos os primos (vocês já sabem, não é? Eu já disse.) iam brincar, sempre que os adultos queriam dormir ou ficar em paz.
E tinha o Ceará.
- E o que é o Ceará?
- É um rochedo que fica à beira mar, marcando o limite entre os dois estados – o Rio Grande do Norte e o Ceará. Pra cá, Rio Grande do Norte; pra lá, Ceará.
- Pra lá, pra cá, como no navio?
- Não! No navio é o balanço. No rochedo, o lado – o lado de cá e o lado de lá.
Nesse rochedo, não sabe, havia uma caverna que os primos e os meios-primos...
- Já sei, você já disse.
Pois é, todos os primos gostavam de visitar. Mas tinha de ser em hora de maré baixa, porque, na maré alta, o mar enchia a caverna de água, de muita água mesmo. E aí, mesmo quem sabia nadar não podia sair.
- Não podia!?
Não! Não podia, porque a água do mar trazia o eco do canto das sereias. Fora isso que os primos ouviram dos pescadores.
- E daí? Que é que tem o canto da sereia?
Você não sabe que o canto da sereia encanta as pessoas e as leva para o fundo do mar? Você nunca ouviu falar de Ulisses?
- Não, nunca ouvi.
Então, já vou lhe contar. Ulisses foi um grego de muito tempo atrás, que, em suas aventuras pelo mar, passou perto da ilha onde viviam as sereias. Mas o herói sabia do perigo de passar por ali, porque quem ouvisse o maravilhoso canto das sereias seria atraído ao fundo do mar. O que foi que Ulisses fez? Quer saber? Ele mandou seus marinheiros taparem os ouvidos com cera e, depois, o amarrarem no mastro do navio.
- Amarrar!? Por quê?
É melhor perguntar pra quê. Para que ele pudesse ouvir o canto das sereias, sem correr perigo. E assim foi. Quando os gênios marinhos...
- Gênios marinhos!? O que é isso?
Ora, é outra maneira de chamar as sereias. Pois bem, quando os gênios marinhos começaram a cantar, Ulisses sentiu um enorme desejo de ir ao encontro delas, mas as cordas que o prendiam e seus companheiros o impediram de ir.
- Mas Ulisses foi esperto, hein!
É, ele era muito inteligente. Mas, voltando à nossa história...
- Sim, à história dos primos, que...
Um dia, resolveram entrar na caverna. Começaram a explorá-la e esqueceram-se da história da maré.
- Espera! Eles estavam explorando a caverna. Encontraram alguma coisa?
Encontraram, sim. Encontraram muita corda, umas bolas grandes de vidro, garrafas de vinho vazias... tudo coisa de navio. E aí a maré começou a subir... a subir... a subir... E eles não perceberam porque estavam na parte mais elevada. Até que um dos primos, ou dos meios-primos, ou dos... você já sabe... olhou para trás e percebeu a quantidade de água que... deu um grito e todos os primos se viraram. E se apavoraram. Mas uma das primas – uma menina que gostava muito de ler e sabia muitas histórias – lembrou-se de Ulisses e de sua experiência com as sereias. Imediatamente explicou o que devia ser feito: os meninos, e somente os meninos, deviam ser amarrados nas rochas pelas meninas.
- Por que só os meninos?
Porque as sereias só atraem os homens. O canto delas não tem nenhum efeito sobre as mulheres. As meninas, então, procuraram os lugares mais adequados e rapidamente prenderam os meninos. E as águas subiram... subiram... subiram... até quase atingir o lugar onde estavam os primos, os meios-primos, os primos tortos... todos os primos. De repente, toda a turminha ouviu... todos os primos juraram que ouviram... uma música maravilhosa, tão encantadora, que eles quase se libertavam das cordas e mergulhavam nas ondas. Mas as cordas estavam muito firmes. Depois de algum tempo, como a maré começou a baixar, o canto foi diminuindo... diminuindo... diminuindo... até desaparecer.
Um dos primos, um dos mais altos (tão alto que até joga basquete), depois que foi libertado das cordas, pensou em uma coisa muito importante:
- Eu acho que não devemos contar nada disso aos adultos. Eles, como sempre, vão dizer que é tudo imaginação da gente.
- Concordo com você. Vai ser um segredo só nosso – disse a prima que conhecia a história de Ulisses.
Esperaram que a maré baixasse mais e saíram da caverna. Puxa! Já era quase noite! Na certa, em casa, estava todo mundo preocupado. Eita! Que carão eles iam levar!
Quando começaram a caminhada de volta, viram – juram que viram – lá longe, no mar, na semi-escuridão do fim da tarde, elevando-se com as ondas, umas figuras estranhas, que pareciam ora peixe, ora mulher. Olharam por alguns minutos e foram em frente. Mas, durante o percurso de volta a casa, tiveram que encher-se de coragem, para enfrentar os adultos. Todos os primos. Primo inteiro e meio-primo. Primo torto e primo direito. Primo de um lado e primo do outro. E primo dos dois lados. Todos os primos, enfim.
- E eles levaram muito carão?
- Ah! isso eu não posso dizer. Só se contratarmos outra história.


Vicência Maria Freitas Jaguaribe
Natural de Jaguaruana-Ce
Professora de Literatura e Estilística da Universidade Estadual do Ceará
Mestra em Literatura pela UFC
Trabalhos publicados nas áreas de Literatura, Estilística e Lingüística do Texto
E-mail: vmjaguaribe@netbandalarga.com.br

MEU CANTO (Odete Ronchi Baltazar)


O sabiá come a banana,

o gaturamo, a sementinha,

o sanhaçu belisca a ameixa,

que está bem madurinha.



E o mamão amarelinho,

quem foi que bicou?

Deve ter sido o tié,

que cedinho aqui passou.



Os pardais, nos beirados,

fazem alvoroço, alegram a casa.

Acordam cedo, muito animados,

felizes por terem asas.



E eu fico feliz

de morar neste recanto.

Tem deleites pra toda a vida,

felicidade por todo o canto.




Odete Ronchi Baltazar, ou odeteronchibaltazar como é conhecida na internet, nasceu em Rio Maina, Município de Criciúma, Estado de Santa Catarina em 1953.
Atualmente reside em Florianópolis.
É formada em Língua Portuguesa, com especialização em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Publica seus trabalhos em sites, blogs, e-books e Antologias que saíram do virtual e foram para o mundo real.
Publicou o livro solo "Só Poesia" em maio de 2006, pela Editora da AVBL.


Seus sites pessoais:
http://www.odetepoesias.com.br/
http://www.palavrasmil.blogspot.com/

quinta-feira, 11 de junho de 2009

BOLINHAS DE SABÃO (Valéria Nogueira Eik)

Carolina foi passar uns dias na casa dos avós, que moravam na fazenda.
Fazia meses que vinha esperando pelo passeio, pois adorava ficar perto da Vovó Hortência e do Vovô Luís.
Corria e brincava o dia todo. E quando a noite se aproximava, a menina mal conseguia tomar o banho e jantar, pois estava muito cansada.
Mas Vovó era firme no taco e sem banho ninguém ficava naquela casa.
A cozinha tinha cheiro de pão que acabou de sair do forno. Era uma delícia!
A cama era macia e os lençóis muito branquinhos cheiravam à limpeza.
Era um convite ao descanso e até mesmo à preguiça.
A noite sobrevoava a fazenda e mal dava tempo do sono sonhar.
E todos se levantavam quando o galo cantava.
O café da manhã era um banquete.
Tinha pão caseiro, requeijão fresquinho, biscoitos e um leite muito gordo e gostoso.
Tinha bolo de fubá, de cenoura com chocolate, de laranja e até de abacaxi.
Carolina saía da mesa quase rolando de tanto comer e a Vovó sorria satisfeita.
Criança é um bichinho engraçado mesmo! Por mais atividade que tenha, sempre quer mais e Carolina não fugia à regra.
- Vovó! Do que eu vou brincar agora?
- Ah, minha filha! Tem tanta coisa pra fazer. Por que você não faz um colar de flores pra Vovó?
- Isso eu já fiz ontem.
- Então, por que você não vai pintar aqueles livrinhos lindos que a sua mãe mandou junto com os seus brinquedos?
- Tô sem vontade, Vovó. Eu queria fazer alguma coisa diferente!
- Ai, minha santa Filomena! Mande uma inspiração! A minha neta quer brincar de alguma coisa bem diferente!
- Quem é essa tal de Filomena, Vovó?
- É uma santa muito inteligente que me ajuda nas horas de apuro.
- E o que ela está falando pra você?
- Não estou conseguindo ouvir! Você não pára de falar!
E Vovó Hortência caiu na risada vendo a cara de espanto da neta.
Depois de pensar uns minutos, os olhos da Vovó brilharam de animação e ela disse:
- Já sei, Carolina! Vamos fazer bolinhas de sabão! E pra isso, vamos precisar de um caule de mamoeiro e uma caneca com água e detergente. O que acha?
- Adorei, Vovó! Quem chegar por último no mamoeiro é mulher do sapo!
Em pouco tempo, as duas estavam sentadas na varanda, fazendo bolinhas de sabão.
E eram tantas as bolinhas de todos os tamanhos, que o sol ficou muito assanhado, achando que elas eram espelhos onde ele poderia se admirar.
A cada sopro, muitas bolinhas invadiam a tarde e pareciam crianças alegres e agitadas.
Às vezes saíam aos pares e Vovó achou que pareciam comadres tagarelando sem parar.
De repente, Carolina fez uma bola muito grande e ficou com pena dela.
- Coitadinha! Ela está muito sozinha.
- É verdade, Carolina. Mas, olhe bem! Ela é única e por isso mesmo, muito especial. Veja como ela brilha. Parece uma rainha!
Vovô Luís chegou e ficou admirando a esposa. Ela estava muito linda e parecia uma menina.
Então, ele se sentou perto dela e falou:
- Minha Hortência! Veja como as bolinhas de sabão são criaturinhas puras e sem vaidade! Elas nem sabem o quanto são belas!
- É verdade, Luís. Elas vivem para colocar sorrisos nos rostos das pessoas de todas as idades.
- Vovô e Vovó estão namorando? Perguntou Carolina, soltando uma risada marota.
- Estamos sempre namorando, querida. É amor!
Vovô Luís soprou o ar do canudinho e duas bolinhas de sabão, muito lindas, formaram um coração e foram subindo, subindo, subindo...
- Como você fez isso, Vovô?


Valéria Nogueira Eik
Fotografias, histórias infantis, crônicas, poemas e contos publicados em vários sites literários. Editora da revista de literatura e arte Conexão Maringá http://www.conexaomaringa.com

quarta-feira, 10 de junho de 2009

LEITE COM CAFÉ (Maria da Graça Almeida)



Sou garoto curioso,

e pra bem me instruir,

o que me é misterioso,

tento logo descobrir.



Sem certeza ou sem fé,

indago desde pequeno:

se a vaca bebesse café,

o leite seria moreno?



do livro Olhos Espertos de Maria da Graça Almeida



Maria da Graça Almeida
Nascida em Pindorama- São Paulo.
Escritora, poetisa, professora, pedagoga e formada em Educação Artística.
Obras Físicas Publicadas:
Espelho, Poesias Sem Mistério, A Graça que o bicho Tem, Que traça sem graça,
Mitos do folclore, A Menina da janela, O Cuco Maluco,
O besouro doente, Olhos espertos
E-mail: ma.gla@uol.com.br

MENINO TRISTE (Ivone Boechat)


Menino triste,
desta rua triste,
vê se encontra o teu lugar,
bate nas portas,
exige tudo,
das almas mortas,
das bocas mudas
pra te escutar.
Menino triste
desta rua triste,
vê se existe
estrela no céu,
sacode as janelas,
acorde as pessoas
que passam na rua,
por passar,
grite por elas,
exige tudo
das almas mortas,
das bocas mudas
pra te amar.


Ivone Boechat
Natural do Estado do Rio.
Membro da Academia Duquecaxiense de Letras e Artes de Duque de Caxias-RJ.
Consultora em Educação.
E-mail: i.boechat@terra.com.br

CABRITO (Nilto Maciel)

Pula daqui, pula dali,
e nunca pára de berrar.
Procura a mãe a ruminar,
comer capim, bem distraída.
E nisso cresce, passa a vida,
até que salta mais e passa
a ser um bode e a ter raça.


Nilto Maciel nasceu em Baturité, Ceará, em 1945.
Ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará em 70.
É editor da revista Literatura desde 91.
É autor de Itinerário (contos, 1974); Tempos de Mula Preta (contos, 1981); A Guerra da Donzela (novela, 1982);Punhalzinho Cravado de Ódio (contos, 198); Estaca Zero (romance, 1987); Os Guerreiros de Monte-Mor (romance, 1988);O Cabra que Virou Bode (romance, 1991); As Insolentes Patas do Cão (contos, 1991); Os Varões de Palma (romance, 1994);Navegador (poemas, 1996); Babel (contos, 1997); Panorama do Conto Cearense (ensaio, 2006) e A Leste da Morte (contos, 2006).
Tem contos e poemas publicados em esperanto, espanhol, italiano e francês.
O Cabra que Virou Bode foi transposto para a tela (vídeo), pelo cineasta Clébio Ribeiro, em 1993.
http://niltomaciel.blog.uol.com.br/
http://literaturasemfronteiras.blogspot.com