quarta-feira, 15 de abril de 2009

QUERO MEU PRESENTE! (Valéria Nogueira Eik)


- Tia rosa, amanhã é meu aniversário. Você vem?
- Claro, meu amor. Pode me esperar.
- Tia Rosa, não esquece o meu presente.
- Não, querida, não vou esquecer.
O telefonema foi interrompido por uma tremenda bronca.
Era Dona Margarida, a mãe de Carolina.
- Menina! O que é isso?
- Isso o quê, mamãe?
- Pedindo presente. Que coisa feia! Isso não se faz!
Dona Margarida estava muito zangada.
- Ah, mamãe. Mas, e se ela vem e não traz presente?
- O mais importante, minha filha, não é o presente. É a presença da pessoa.
- Não é não! O mais importante é a pessoa trazer presente.
- Carolina! Não quero brigar com você. Ainda mais na véspera do seu aniversário. Não faça mais isso. Estamos entendidas?
- Tá bom. Tá bom.
E lá se foi a Dona Margarida tratar de fazer brigadeiros, beijinhos de coco, e toda a sorte de docinhos deliciosos.
E Carolina agarrou o telefone.
- Alô, Vovó.
- Oi, minha netinha.
- Vovó, amanhã é meu aniversário. Você vem?
- Imagina se vou perder a festa da minha netinha! Claro que eu vou!
- Não esquece o meu presente, tá?
A Vovó Hortência riu muito.
- Não vou esquecer, querida. Seu presente já está aqui em cima da mesa.
- O que é, vovó?
- É surpresa!
- Conta, vovó. Conta. Conta.
- Nada disso! Amanhã você fica sabendo o que é.
- Tá bom. Tá bom.
Carolina estava ansiosa pelo dia do seu aniversário.
Ia fazer seis anos.
Convidou todos os amiguinhos e todos os parentes.
A festa prometia ser um sucesso.
E a menina só pensava na tal festa há mais de um mês.
- Vai ter bexiga, mãe?
- Vai, Carolina.
- Brigadeiro?
- Vai, menina.
- Presentes?
- Vai brincar, Carolina!
E hoje era a véspera do grande dia.
A garota não conseguia se concentrar nos desenhos da televisão, nos brinquedos, nas traquinagens.
Nem mesmo Girassol, seu cachorrinho, o Gira, como era chamado na intimidade, despertava nela a vontade de correr e brincar.
Deitada no sofá, de olhos fechados, ficava imaginando a festa.
Muitos balões coloridos pelo teto e pelas paredes, muitos docinhos gostosos, tortas de chocolate, de morango, sorvetes.
Pasteizinhos de carne, coxinhas de frango, pizza, bolinhas de queijo, que delícia!
E presentes!
Contava nos dedos o número de convidados e sorria feliz.
Muitos convidados, muitos presentes.
Naquela noite, nem conseguiu dormir direito.
Parecia que a cama estava repleta de formiguinhas.
Rolava pra lá, rolava pra cá, e nada do sono chegar.
Senta, levanta, escorrega no lençol, e nada de dormir.
Foi aí que o João Pestana apareceu.
João Pestana? Opa! Quem é esse cara?
É aquele homenzinho gordo e barrigudo, com bochechas vermelhas e um sorriso generoso, que faz rolar barris de sono sobre as nossas pestanas.
É tiro e queda! O sono vem mesmo!
E foi ele quem fez a menina dormir pelo menos por algumas horas. Mas, fez.
Quando o sol chegou, Carolina já estava andando pela casa, olhando o relógio, fazendo mil barulhos para acordar a mãe.
Pobre Dona Margarida!
Ficara até muito tarde fazendo as tortas, os docinhos e os salgadinhos.
Mas, amor de mãe não tem tamanho e ela abraçou e beijou a filha, cheia de ternura e bom humor.
- Então, meu amor, hoje é o dia do seu aniversário.
- É, mamãe.
- Eu me lembro quando soube que estava grávida.
- Você ficou feliz, manhê? E o papai?
Carolina já sabia toda a estória, de trás pra frente e de frente pra trás, mas, adorava escutar de novo e de novo e de novo.
- Muito feliz! Papai também ficou muito feliz!
- E quando eu nasci, você ficou feliz? E o papai?
- Muito feliz, querida! Você foi o maior presente que Deus nos deu. Seu pai ficou todo orgulhoso por ter uma filha tão linda!
- Manhê! Por falar em presente. Cadê o meu presente?
- Você não toma jeito mesmo, hem, menina?
As duas riram e Carolina ganhou o primeiro presente do dia.
Era o tão esperado pula-pula.
Monta daqui, desmonta dali, remonta de lá.
Finalmente, o pula-pula estava pronto sobre o gramado muito verde do quintal.
E Carolina deu sossego por um tempo.
Almoçou, pulou mais um tanto e até brincou com o Gira.
Tomou banho, colocou o vestido novo e grudou o nariz na vidraça da janela, esperando os convidados.
Primeiro chegou a vovó Hortência.
Depois veio tia Rosa e mais a família.
Tia Tulipa, tia Amarílis e tia Alamanda chegaram em seguida, muito juntas, fazendo folia.
Só a tia Violeta é que estava um pouco atrasada, mas veio. E trouxe um presentão!
Os amiguinhos foram chegando, aos poucos, uns meio tímidos, outros salientes demais, mas todos eles trouxeram presentes.
E foi uma festa pra ninguém botar defeito.
Correria, papel no chão, guerra de brigadeiros, pula-pula, comilança, música e gritaria.
Cantaram o “parabéns a você”.
As seis velas se apagaram sob uma garoa de sopros.
Beijos e abraços.
Fotografias fazendo caretas, fotografias com os parentes, com os amiguinhos, com papai e mamãe e até com o Gira.
E tarde da noite, as últimas crianças foram embora e a festa acabou.
Dona Margarida olhou para a sua casa e teve vontade de chorar.
Era tanta bagunça, mas tanta bagunça, que ela resolveu ir dormir e deixar todo o trabalho para o dia seguinte.
Antes, porém, foi dar uma espiada na aniversariante.
Ela estava dormindo e parecia um anjo.
O nariz estava pintado de brigadeiro.
Sim. Era um anjinho levado da breca. Mas era um anjinho.
E como era linda!
Seu rostinho estava sereno e ela dormia abraçada com a felicidade.
Dona Margarida falou baixinho:
- Feliz aniversário, minha filhinha. Que a vida seja muito boa pra você. Que Deus te proteja!
Saiu do quarto com lágrimas nos olhos.
Era amor. Somente amor. Um amor do tamanho do céu com as estrelas e do tamanho do mar com os peixinhos. Infinito.

(Valéria Nogueira Eik)